Na maioria das vezes ele me ouve e me chama de burro.
E sempre acha que se tivesse escolhido o que minha rival propôs se daria melhor.
Mas é só uma tática de defesa dele. Porque no fundo ele sabe que eu estava certo.
E ele sabe que eu não minto.
Eu tenho 15 anos de idade. E já vivi muita coisa.
Já vi muitos da minha espécie pararem de funcionar. Já vi uns que se machucaram. E feio, por suas próprias idéias. Mesmo que sofridos fins, são verdadeiros mártires. Ou simplesmente cegos.
Nós temos várias sensações diferentes. Mas tem uma que é a que mais nos afeta.
Tem uma que sempre requer de nós um esforço maior. Uma concentração.
Só que essa sensação nos domina. Isso pode ser bom...mas também pode ser ruim.
Eu ouvi vários relatos por aí de peregrinos da minha espécie, que simplesmente escolheram viver aventuras...e não se arriscar nessa tal sensação.
Bom, eu ainda não sei descrevê-la muito. Porque a estou conhecendo.
O meu hospedeiro deixa que eu o controle por inteiro. Seus movimentos...braços, pernas...e até mesmo a minha rival...eu tenho acesso. E o afeto de uma maneira extraordinária.
Ele sempre me dá mais ouvidos do que a minha rival. Ela é metida e sensata. Achando que sabe de tudo.
E eu?! Bem... não sei de muito. Mas sempre prefiro arriscar. E o meu hospedeiro sempre me escolhe.
Só que esses riscos incluem perigos.
1 - Eu posso me ferir. E independente da proporção de minhas feridas, posso ficar por um tempo indeterminado modificado. Dizem que um dia posso até calejar de tanto me ferir, se for o caso.
Mas eu não acredito.
2 - Eu posso me perder. E me embaralhar em todas as minhas escolhas. E se eu me perder de verdade, afetarei 100% a vida do meu hospedeiro.
3 - Posso desfalecer em partes e talvez não mais me curar. É a pior consequência.
Mas como eu disse anteriormente, tem uma sensação que nos molda...que nos controla, até mesmo descontrolando o hospedeiro.
E essa sensação pode ser fatal dependendo de seu fim.
E eu já vi muitos de meus amigos passarem por esses 3 casos que citei acima.
Uns considerados por nós tolos...e outros corajosos e sonhadores.
Eu não sei em qual me definir. Fato.
Mas sei que é um fardo, um pensamento que me acompanha desde o momento em que começo a me movimentar mais rápido.
Sim...essa é a sensação.
A sensação que sinto quando outro de minha espécie se aproxima. Não posso vê-lo, não posso tocá-lo. Mas posso senti-lo. E quando sinto sua presença eu deixo o meu hospedeiro MALUCO.
Eu fico tão ofegante, feliz, e alucinado que ao sentir que o outro está se distanciando conto as horas para senti-lo novamente.
Assim, eu acabei descobrindo que não sou inteiro. Tem uma outra parte de mim vagando por aí. E é essa outra parte que me deixa vibrante com sua presença.
Mas sei dos riscos. Sim, é essa a sensação que descrevi ser a mais perigosa.
Ela é a mais forte, mais sem sentido, louca e suave sensação.
O amor.
Todos da espécie sabemos disso...os riscos. Mas os covardes, peregrinos sabem que um dia terão de abrir mão de sua covardia. Pois nada nos deixa mais feliz que essa sensação.
E se ela causar-nos danos. Basta esperar e orar por uma absolvição.
Somos corações, e merecemos continuar batendo mesmo que venhamos a sorrir ou a chorar. A razão, é nossa eterna rival; sempre pronta para acusar-nos
Mas essa é nossa dádiva ou maldição. Estar propensos a sofrer por uma nobre causa e um doce risco."
